O mediador não julga, não decide e, portanto, não
deve tomar partido ou se posicionar em relação às partes. Não é sua função. Ponto.
Se o mediador, de qualquer forma, beneficia uma
das partes em detrimento da outra, está errando sobre vários aspectos.
Inicialmente pela quebra de confiança no processo,
já que as partes precisam confiar que o mediador seja imparcial para cooperar.
A parte que vê no mediador um aliado da outra parte agirá de acordo com essa
visão, de maneira consciente ou não.
Erra também ao prejudicar diretamente ambas as
partes, independente que quem esteja supostamente sendo beneficiado, pois a
mediação deve empoderar as partes, auxiliando-as a tornarem-se capazes de
resolver seus conflitos de forma mais eficiente; e com o “empurrãozinho” do
mediador, estarão recebendo uma ajuda que não se prolongará no tempo, já que,
terminada a mediação, as relações entre as partes continuarão e não haverá um
mediador todo o tempo para guia-los.
Vale lembrar que o mediador que atua na esfera
judiciária está atuando como agente público naquele momento. E a mediação
judicial é um serviço público, devendo respeitar os princípios do Direito Administrativo,
como os princípios da igualdade e da isonomia. Lembremos, ainda, que o Estado tem
responsabilidade civil sobre os danos causados por atos de seus representantes,
cabendo indenização à parte prejudicada pela atuação do mediador que agiu de
má-fé ou de maneira imprudente.
O dever de imparcialidade não deve ser apenas objetivo,
deve ser também aparente. As partes precisam perceber nos mediadores a postura
imparcial. A confiança no processo depende dessa percepção.
O mediador não é uma criatura fria e sem
sentimentos. Sentir uma afeição maior pela situação de umas das partes, ou
mesmo considerar que uma parte está certa ou errada, é parte da natureza humana.
O que o mediador não deve é permitir que estes sentimentos e estas considerações
influenciem seu trabalho e contaminem sua atuação.
É um tanto comum as partes buscarem a parcialidade
do mediador, agindo de forma a tentar influenciá-lo, ou convencê-lo de que estão com a razão. Por mais que expliquemos que o mediador é imparcial e neutro, e
não tem poder de decisão, muitos mediandos continuarão a tentar “puxá-lo” para
seu lado, na tentativa de ganhar, no mediador, um aliado contra a outra parte.
Tal postura é previsível e deve ser vista pelo mediador com algo normal a um
conflito. Cabe a nós explicarmos, de forma adequada, nossa função. E um bom
mediador não pode ser pego de surpresa por este tipo de situação. Ao contrário,
deve possuir ferramentas para lidar com os diversos tipos de comportamento que
as partes apresentam. Buscar aliados é parte da natureza social do ser humano.
Uma mediação bem conduzida, porém, demonstrará às partes que convencer ou não o
mediador não é necessário nem desejável.
Exemplificando:
Numa mediação que trate de um divórcio é comum haver uma certa
identificação de gênero das partes com os mediadores, como uma esposa que pode
buscar amparo em uma mediadora, usando argumentos como: “Você também é mãe, você me entende...” ou um
marido que busque a solidariedade do mediador com argumentos como: “A gente que
é homem sabe como funciona cabeça de mulher...”
Tais momentos podem se tornar verdadeiras armadilhas para o mediador desatento.
São momentos delicados onde o mediador deve ser
vigilante com sua postura. Numa sessão em conjunto, frases em resposta aos
exemplos acima como: “Claro, eu entendo....” ou “Sei bem como é...” são facas
de dois gumes. Numa tentativa de parecer simpático ou solidário com a parte, a
fim de, talvez, melhorar o rapport
com a mesma, o mediador cria a embaraçosa situação de estar sendo visto pela
outra parte como alguém parcial, alguém que “está do lado do outro.” Nunca é
demais lembrar que as partes agem não de acordo com a mera realidade, mas de
acordo com sua percepção de
realidade. Se a parte o percebe como parcial, o trabalho já estará prejudicado,
independentemente de você estar ou não o sendo.
Tais armadilhas são tentadoras, pois gostamos de demonstrar simpatia, de deixar a pessoa à vontade para se abrir. Podemos fazer isso instintivamente, sem ao menos percebermos. Agindo com boas intenções prejudicamos a própria mediação. Mais um motivo para o mediador diligente evitar agir somente com base em seu instinto e sua experiência pessoal. A observância da boa técnica pode salvar a mediação em casos assim. Alinhe sempre sua experiência a uma boa técnica.
Devemos também mencionar as situações onde uma
parte é mais carismática, mais comunicativa, ou mesmo situações de maior poder
aparente de uma parte em relação à outra. Um possível exemplo seria uma
mediação envolvendo um gerente de banco e um trabalhador de baixa renda e pouca
instrução. É bem possível que o gerente se mostre mais articulado, mais à
vontade, etc, e isto pode criar a aparência de uma dominação sobre a outra
parte na própria mediação. A parte que sentir que a outra se mostra mais
articulada e dominante tenderá a desconfiar da parcialidade do mediador e
adotar posturas defensivas, como a agressividade ou a retração. Mais uma vez o
mediador deve ter a capacidade de manejar a situação de modo a ambos se
sentirem empoderados e ouvidos em igualdade de condições.
Até mesmo a escolha de vocabulário do mediador
pode influenciar na forma coma as partes veem sua imparcialidade. Um palavreado
mais próximo ao linguajar jurídico, por exemplo, pode soar confortável para uma
parte e intimidador para outra.
O mediador deve ser vigilante com estas situações
e buscar sempre estar preparado para imprevistos. Tenha estratégias para agir
em situações como as exemplificadas, onde uma parte busca influenciá-lo, ou
onde uma parte se sente desempoderada no próprio processo de mediação por
questões sociais ou culturais. Antecipe-se aos imprevistos e tenha o maior
domínio possível de suas técnicas, afim de poder se flexibilizar e se adaptar a
cada situação.
Abraços e boas mediações.